20.6.08

Paixão Nacional

Numa sala de reunião qualquer na cidade maravilhosa, lá estavam os figurões, autor, diretor, marketing, lobistas, enfim todos os que decidem as coisas importantes da emissora. Estavam lá para decidir os rumos da nova novela do horário nobre. Na sala lá estava um dos diretores da emissora na frente de uma lousa branca, de terno, gravata, todo carismático com seus quase 30 anos deu inicio à reunião, esfregando as mãos:
- Boa a tarde senhores, estamos aqui para decidir qual será a próxima novela que colocaremos no horário nobre, temos aqui a ilustre presença do nosso grande autor João Emanuel - diz o jovem diretor entusiasmado por acertar a frase – ele irá resumir um pouco do enredo da trama (sic) para vocês. Pode começar João:

- Primeiramente, bom dia à todos, vou ir direto ao assunto, a trama (sic) é a seguinte... - Diz o grande autor, levantando da mesa em que estava sentado e indo em direção à lousa.

- Bom, é uma história que se passa nos tempos atuais mesmo, a protagonista se chama Laura, que é uma garota rica, meiga e sonhadora, ela é criada pela avó, pois a mãe abandonou ela quando ela era criança, cof-cof, perdão senhores, mas aí existe um trunfo!

- Disse o autor entusiasmado. A mãe da menina na verdade não abandonou ela, na verdade mesmo a avó paterna que cria ela tramou um acidente que acabou tirando a memória dela! Sacaram!?

Nisso o jovem diretor da emissora apontou ao autor como quem diz “Esse cara é foda!” e já começa a esfregar as mãos pensando em como gastará os milhões. No fundo da sala sentado no canto da mesa um rapaz do departamento de marketing de um dos patrocinadores dá uma bufada e observa o autor continuar com sua genial idéia.

- Elas vão se conhecer sem saber que são mães e filhas, Helena que é a mãe dela é uma senhora humilde, que tem um filho adotado, Laura vai namorar com o rapaz, no caso o Henrique, mas a avó dela não vai aceitar porque ele é pobre e... Quando o autor ia continuar com o resumo da novela foi interrompido, por uma voz lá do fundo da sala, era o rapaz do marketing de um dos patrocinadores, que levantou, para espanto de todos e começou a falar:

- Deixa eu adivinhar, as duas vão ser amigas, só que quando elas descobrirem, a filha vai ficar com raiva da mãe porque ela não a procurou durante todos esses anos e porque ela acredita que foi abandonada pela mãe, vai haver também um conflito entre o casal porque esse tal de Henrique vai tomar as dores da mãe e vai ficar nisso, a causa de tudo isso é porque a avó era uma mulher ambiciosa que fez de tudo para matar a nora depois que o filho dela morreu, e ela tem uma filha que é uma dessas mulheres perigosas, gostosas, maliciosas que vai tentar roubar o namorado da sobrinha.


- Mas peraí! - Disse o autor nervoso.


- Tem mais essa Helena, aposto que você pensou em sugerir Regina Duarte pro papel né?


- Hum... Realmente, mas como você sabe o roteiro da novela?

- Essas histórias são todas iguais, porra! Sempre tem filho bastado! Sempre tem peruas invejosas, sempre tem mulher desputando homem...

- Mas é isso que rende audiência, Carlos!

- Disse o diretor da emissora tentando defender o autor.

- O autor aqui sou eu meu amigo! Você cuida da sua parte que é marketing! Eu sei que você chegou à essa posição puxando muito tapete! Duvido que você escreva algo com um terço de qualidade que meu roteiro, demorei meses para escrever essa trama.

-Tempo desperdiçado à toa, com essas histórias maçantes.


-Então porque você não vira autor tendo em vista que você é tão bom assim?

-Temos que inovar, inclusive, ontem à noite eu escrevi um roteiro bem melhor que esse seu que demorou meses – disse o marketeiro tirando do bolso um papel de caderno.


-Ah! Não acredito? Que merda é essa!? Uma fábula?


-Espera aí seu autor de merda, se liga isso sim é novela rapá!
Bom pessoal como vimos nessa novela anterior, é grande a influência das novelas no povo, colocaram a Flavia Alessandra fazendo aquelas dancinhas escrotas no poste e as mulheres saíram por aí procurando cursinhos para aprender a dança. Desta vez, temos uma personagem é recatada e quer casar virgem, mas o seu namorado não agüenta mais esperar, então ela decide dar o ... bem como eu posso falar... bom ela decide liberar esgoto para o namorado dela.

Nisso todos na sala começaram a rir, até mesmo o autor, mas ele não contente:


-Peraí! Isso não é brincadeira, vai dizer que não seria bom incentivar as mulheres a fazer sexo anal, vai me dizer que se a moda pegasse ninguém aqui gostaria?

-Vai à merda! Disse um dos representantes de outra empresa interessada em fazer propaganda.

-Cala a boca aí Negão, eu sei que pra você tanto faz, pois você vive se atracando com outros machos! Todos da sala sabem que te pegaram na sala de arquivo junto com o Tião com as calças tortas.

O Negão foi pra cima de Carlos e ali estava feita confusão, com aquela encrenca, Carlos foi demitido e a novela que foi ao ar foi mesmo a do autor João Emanuel.
Meses depois Carlos está voltando de uma entrevista e em todo o caminho ouve pessoas comentando sobre a novela e desejando a morte da vilã, Carlos pensa consigo mesmo como pode esse povo ser tão tonto, como pode eles sempre morderem o mesmo anzol, ficou puto com os rumos que sua vida tinha tomado, de diretor de empresa a executivo desempregado, chacota do pessoal do ramo. Carlos chega em casa e liga a secretária eletrônica “Chuuuuuuuupaaaaaaaaa!!! Carlos filho da puta! 43 Pontos de ibope!!!” era o autor se vangloriando do sucesso. Carlos chegou em seu limite, 2 dias depois foi encontrado morto, havia cometido um suicídio, mas não vá achando que ele era um idealista que se matou por conta da burrice do povo, junto dele foi encontrado um bilhete:



“Eu só queria comer um cuzinho!”
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