Lobiza, assim que era conhecido no bairro, era um senhor de 48 anos que tinha uma vida nômade antes de se instalar num cortiço da rua mais perigosa de todo o Ipiranga, vivia da coleta de papelão, latinhas e também de alguns bicos. De uma maneira que ninguém entendia, toda tarde mais ou menos as 18:00, ele sentava no banco da praça jogava pão aos pombos, enquanto olhava para o além pensando em sua vida, tirava uma caneta do bolso e começava a escrever, alguns diziam que corriam lágrimas de seu rosto sofrido e miserável quando ele escrevia, todos tinham curiosidade de saber o que era.
Seu passado lhe condenava aos 14 fugiu de casa para viver um amor com uma adolescente, um ano depois fugiu de novo após descobrir que sua namorada esperava um filho a partir daí viveu sem-rumo e sozinho por alguns anos, mas não era mais aquele jovem indeciso e fujão, era um pai de família de passado vergonhoso e de futuro imprevisível. Em mais um de seus dias em que está voltando pra casa ouve uma voz lhe dirigindo a palavra uma coisa rara de se acontecer, era Kelson o jovem traficante da área:
- Chega aí Lobizá!!
- Diga Kelso!
- Bem, é o seguinte quer ganhar 50 reais?
- Hum! Contanto que não fira minha honra!
- É que eu e os caras tamo apostando, pra ver se você consegue beber esse copinho de cachaça numa golada só! Diz Kelson com um “copinho” de 800ml (aqueles de vitamina) transbordando em sua mão, com um sorrisinho no canto da boca.
Lobiza não pensou duas vezes, alias, nem pensou, mandou pra dentro numa golada só, limpou a boca com a manga da camisa e pegou sua preciosa “onça”, deu uns três passos no quarto caiu no meio da rua, o povo foi acudi-lo, mas não sabia se ria ou se ajudava. As crianças tentavam pegar sua onça, mas ele estava bêbado e não morto. Kelson e seus choravam, mas de rir.
Com aquela multidão em volta quase não dava pra sentir o odor de álcool com sangue que de algum modo jorrava do nariz de Lobiza, mães desesperadas gritavam para seus filhos saírem de perto, pois ele tinha AIDS e nem ligavam para os filhos de Lobiza que estavam perto esperando o momento de seu pobre, mas querido pai acordar e ir gastar a onça que seu pai tinha embolsado, depois de uns 30 minutos ele acordou com um ar de zonzo mas ainda apertando a nota de cinqüenta na mão que nem desmaiado ele soltou, valeu o esforço ele se levantou e foi ate a padaria com seus filhos (que diga-se de passagem não se pareciam com ele) e or lá deve ter gastado seu dinheiro. Um dia após isso nunca mais foi visto.
Informe: Lobiza, essa foi para você, eu vou guardar o seu sorriso vazio, vestido com a camisa do Corinthians ou cantando baixinho as musicas do Raça Negra. Infelizmente o mundo é cruel para pessoas virtuosas como você, pode ser que você já esteja morto ou sendo morto nesse exato momento, mas ninguém conseguirá matar na minha memória a sua imagem batucando na caixa de fósforos as canções de Bezerra da Silva.
Escrito por CQCM que lembrou de um dorme-sujo e chorou por não poder voltar o passado e não gosta nem um pouco de falar de si mesmo na terceira pessoa.
2 comentários:
belo texto, bela homenagem, e belas questões para se pensar, sobre essas figuras públicas que participam de nossas vidas.
o texto ficou bem legal. eu chamaria a atenção para algumas vírgulas e pontos que poderiam ser colocados: "Seu passado lhe condenava aos 14 fugiu de casa para...", "sua namorada esperava um filho a partir daí viveu sem-rumo", e assim por diante.
mas tuas idéias e temas são muito bons!
Diversas maneira de encarnar um personagem, ou ser um narrador.
A pessoa, o gênero, o número e o grau pouco interessam.
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